terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Dia 38

Nossa saída do shopping foi um tanto quanto assustadora. Resolvemos sair à noite, pois acreditamos que tem sempre menos movimento – embora tenhamos observados que os mortos-vivos não dormem ou descansam (eles podem te seguir por dias, sem parar).

A febre de Anna baixou, mas a cabeça deve ter ficado quente quando saímos. Dentro do shopping não havia quase nenhum zumbi, mas do lado de fora havia vários. Tive de atropelar um bocado deles e isso fez a gente mudar de planos. Ante de nosso próximo destino, resolvemos passar no setor de oficinas de Taguatinga (aqui em Brasília, para quem não conhece, tem setor para tudo, até para motéis).

Lá, fui até a oficina de um amigo de meu pai, o Marcinho (modo de dizer, pois ele tinha uma pança enorme). Foi ele quem me ensinou, no “olhometro”, como se faz soldas grandes. O setor estava meio vazio (de mortos-vivos), então não tivemos problemas em entrar na garagem e fechar a porta. Minha intenção? Soldar todas as barras de ferro possíveis na frente do carro, nas janelas e na frente do para-brisa. Sem isso, atropelar mais alguns carnívoros vai ser problema. Uma hora acaba prejudicando o motor e vai nos deixar na mão.

O trabalho, para quem fez sua primeira solda, ficou ótimo. Feio, mas prático. Eles podem nos cercar e até quebrar os vidros, mas não vão conseguir entrar. O problema é que quase no fim do trabalho fui surpreendido por algo que não esperava. Descendo as escadas de cimento, no fundo da loja (que leva a um segundo andar sem janelas), apareceu Marcinho. Hesitei por alguns segundos, mesmo vendo que seu macacão estava enegrecido de sangue seco e que sua pele estava quase cinza. Não sei se foi impressão, mas ele também pareceu hesitar quando me viu agachado próximo ao para-choque. Como se me reconhecesse.

Mas isso, se realmente aconteceu, durou três segundos. Depois, ele correu como pôde em minha direção, escancarando a boca, ávido por carne, por sangue. Anna se encolheu no canto e esperou que eu tomasse a devida atitude. O que não aconteceu de imediato. Marcinho se jogou em cima de mim com todo o seu peso e chegou a aproximar sua boca putrefata do meu pescoço. E tive muito trabalho para empurrá-lo para longe.

O tiro que dei na cabeça de Marcinho doeu em mim. De verdade. Foi a primeira vez que tive de atirar em alguém conhecido. Talvez por isso não tenha ido procurar parentes. Posso imaginar quantos hesitaram e morreram. Ver o corpo de um amigo, mesmo que distante, tombar na minha frente após um tiro foi penoso. Minha mão tremeu por alguns minutos e não sei o que aconteceria se tivéssemos que enfrentar mais alguns deles naquele instante. Sorte que Anna pegou uma das armas e fez uma “varredura” no andar de cima (tinha me esquecido que a oficina tinha um andar só para peças e bagulhos).

Estamos indo para uma chácara. Não sei o que encontraremos lá, mas me deu na telha que, longe da cidade, podemos estar mais seguros. E por todo o caminho fiquei pensando em Marcinho. E na escada. Se ele subiu e desceu aquilo lá, fico me perguntando o que esses mortos-vivos, antes tão burros, podem fazer...

Um comentário:

  1. Consegui um tempo para relatar. Minha fuga foi uma loucura, estou em SP já mas não faço idéia da onde. Não tem placa, nome nem número só sei que é na zona leste. Estou em uma casa bem pequena com uma entrada bem escondida. Felizmente tem energia aqui ainda e água, consegui um sinal wi-fi também, essa foi minha sorte. Vi que vc perdeu uma companheira, fico triste por vc mas se foi necessário, melhor que seja assim. Fiquem bem, não tenho tido mais notícias dos outros, vc tem? Estou preocupado com o casal com a criança pequena.

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